domingo, 27 de setembro de 2020

PARA JAYA MAGALHÃES, PORQUE VOA


"Mas hoje eu sei o que quer dizer esperança, 
podem me perguntar que eu sei. 
Só não posso responder."

(Lygia Fagundes Telles - As horas nuas)


 Querida Jaya, 


eu tinha um milhão de palavras pra escrever, mas tudo que consegui foi ficar em silêncio. Fechei os olhos e as palavras se deitaram no meu peito. É tipo o sol deitando no horizonte, dizendo tanta coisa, mas sem nenhuma palavra. A gente tem tanto a aprender com o silêncio, não acha? Tenho pensado bastante no quanto é importante não dizer. Meu Deus, pra quê essa necessidade de falar o tempo todo, não é mesmo? 

Tô enfrentando alguns desafios no trabalho. Sabe quando as pessoas extraem o seu pior? Eu tenho tanta coisa boa pra oferecer, mas às vezes me sinto "contaminado" e vou deixando gostos amargos nas pessoas, nas coisas, em mim. Fico querendo discutir, justificar, esclarecer, provar a todo custo que eu tava certo, quando na verdade não tem certo ou errado. Quando na verdade não vai mudar o que já foi feito. Difícil perceber que a gente tá indo por um caminho contrário, mesmo que a contragosto. 

Quando me sinto assim gosto de caminhar descalço pela casa, deixar os pés sentirem o gosto do chão, tomar banho de mangueira no quintal, prestar atenção nos pardais que, vez ou outra, arriscam um pouso pra pegar alguma comida ou inseto, essas coisas simples que nos colocam em sintonia com nossa essência. Gosto de sentar ao sol no fim da tarde, fechar os olhos e pedir ao astro rei que me ilumine de luz e sabedoria. Depois escolho um poema - geralmente da Adélia - e leio em voz alta, várias vezes. É tão difícil ter sabedoria, não acha, minha amiga? Saber o que fazer e como fazer, saber quando fazer. A gente quer agir no impulso e acaba desencadeando uma sucessão de acontecimentos e, até mesmo, mágoas. Preciso aprender a calma, controlar os impulsos, extrair a coisa boa que eu sei que tenho e posso oferecer. O tempo tá passando tão rápido e tem tanto doce pr'eu provar, pra que ficar mastigando o amargo, né mesmo? 

Jaya, acho que você não se lembra, mas uma vez - já faz uns três anos - você me desejou um abraço cheio de asas. De lá pra cá eu sempre penso nisso, nesse abraço capaz de fazer voar. Acho que essa é uma das coisas mais preciosas que esse vírus maldito nos roubou, o abraço. Porque a gente, tô te incluindo nessa porque te conheço, a gente gosta de entrelaçar os braços, coração com coração. A gente gosta de gente de verdade, que abraça forte, que chora e sorri com o corpo inteiro. A gente gosta de vibrar junto. E tá tão difícil essa distância, essa secura, os sorrisos escondidos atrás das máscaras, as mãos longe. Mas eu tenho esperança que logo logo haverá novamente o tempo das asas. Sairemos de nossos ninhos e vamos entrelaçar nossos braços fazendo voar todo mundo que a gente ama. 

Eu sei que tô bastante cansado e tenho reclamado muito, mas eu tenho esperança sim. Ah, eu tenho muita esperança, é que as vezes não consigo dizê-la. Tipo as cigarras, que gritam porque acreditam. Eu acredito e grito também. 

Minha amiga, desejo a você um tempo de aprendizado e, assim que possível, muitos braços pra te fazerem voar, porque eu sei que você voa. 

Te quero um bem que nem sei dizer. 

Wendel



Ps. Tava aqui escrevendo e uma cigarra começou a cantar. Alguma coisa boa vai acontecer. 


Ps. Se encontrar algum erro de ortografia, por favor, releve. Escrevi e postei. Se o erro for gramatical, fique feliz por mim. Morro de medo de ser um estudante de letras daqueles chatos que não sabem mais errar. 

2 comentários:

  1. Não sei se você sabe, mas eu tenho vindo aqui ler isso todo dia. E o bem que me faz é sempre maior. Obrigada por existir na minha história!

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  2. Vim aqui achando que ia ter poema novo e tal. Mas nem fiquei com raiva pois, por mim, essa carta pode ficar aqui no início pra sempre. Toda vez eu vou reler. Toda vez eu vou sorrir. E toda vez eu vou agradecer. <3

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